GALERINHA MÊS DE DEZEMBRO ESTIVE AUSENTE DEVIDO AS CORRERIAS DE FIM DE SEMESTRE, CONTUDO VALEU A PENA. SEGUE ABAIXO O REGISTRO POR ESCRITO DA MINHA PRIMEIRA COMUNICAÇÃO. FOI MASSA, VALEU JOÃO!
(COMUNICAÇÃO PROFERIDA NO II SIMPÓSIO DO MESTRADO EM CIÊNCIAS DAS RELIGIÕES, DA FACULDADE UNIDA DE VITÓRIA)
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Segundo
Inês Lacerda Araújo, professora do departamento de Filosofia da PUCPR, deste o
fim do século XIX, quando o tema da linguagem se tornou objeto de preocupação na
filosofia, o mesmo vem sendo considerado nas seguintes dimensões: signo, proposição, ato de fala e discurso. E segundo a
autora, estas dimensões embora separadas para fins de análise, na prática da
linguagem elas se articulam não sendo possível isolar umas das outras. É desta maneira
que a autora trabalha em seus textos com a hipótese de que subjetividade e
linguagem não são excludentes e que, portanto, quando o nosso pensamento se
volta para um destes objetos, o outro não pode estar ausente/afastado, (ARAÚJO,
2004/2007), pois
[...] é num mundo permeado de signos, interpretado por signos, “semiotizado”
pela linguagem e objetivado por atos de fala que pessoas [...] se comunicam e
têm em vista certos propósitos, em função dos quais agem, argumentam, valoram,
produzem saber, cultura. [...] (ARAÚJO, 2007, p. 102)
Deste modo, trazemos estas considerações iniciais a fim de
refletirmos, conforme trabalhamos em nosso artigo, no sentido de que há na escrita
nietzschiana um modo muito próprio e particular de ser-existir Nietzsche
no mundo e para o mundo. E que, portanto, sua escrita se constitui como uma
expressão de sua subjetividade, ou seja, a materialidade dos seus
processos/modos de subjetivação e que dizem respeito à criação de modo de
existência e de estilo de vida. Desta maneira, por meio de um modo
heurístico-performático-criativo de escrever, Nietzsche suscita questionamentos
em seus leitores que foram gestados por meio de suas vivências e experiências
existenciais. Uma heurística performática, porque há performatividade aí,
contudo há uma heurística da criação, que parte do autor ao leitor e do leitor
ao autor, em um movimento circular. Assim, ao pensar
a escrita nietzschiana como sendo uma expressão/tentativa
heurístico-performática-crativa de superação das próprias limitações da
linguagem. Uma escrita arte. Um modo de expressão de sua subjetividade por meio
da linguagem escrita, como resultado de um processo/experiências. Um modo de
comunicar-se e colocar-se no mundo não podemos desconsiderar a receptividade
que esta comunicação de vivências internas cheia de performatividade
estilística desperta em seus leitores.
O
CONCEITO DE COMPAIXÃO NA ESCRITA NIETZSCHIANA: HEURÍSTICA-CRIATIVA E
PERFORMATIVIDADE
Sustentamos
deste modo, em nosso artigo, que o conceito de compaixão é exposto nos textos
de Nietzsche de modo hiperbolicamente agressivo e que o mesmo é pensando
em confronto direto, com aquele que ele mesmo classificou como seu mestrecontudo
consideramos também, que não podemos apenas falar de uma intertextualidade,
e/ou relação de oposição entre textos filosóficos divergentes, pois sustentamos
que na escrita nietzschiana é o ato de posicionar-se na vida que grita. E não é
apenas um grito de refutação na busca pela vontade
de poder, e/ou uma ideologia de classes, mas, é o filósofo/filólogo de formação
religiosa judaico-cristã descobrindo genealogicamente os conceitos. Fazendo
questão de ao re-colocar não apenas recorrer a uma relembrança de alguém, mas,
aqui, o que se quer é descobrir e não descrever novamente o que já foi dito por
alguém; pois não é a compaixão o seu problema maior, apesar de ser esta também
um problema para Nietzsche, contudo, é a moral e o valor da moral enquanto
problema que envolve o ato de compadecer-se que lhe interessa e está em
questão.
Deste
modo, mostramos no artigo que a formulação do conceito de compaixão para estes
dois filósofos têm como base uma perspectiva antropológica, pois é a partir do
modo como ambos percebem as relações humanas que o conceito é formulado e
trabalhado. Para Schopenhauer “é especificamente o sofrimento dos outros que
faz com que os homens se comovam”, ou seja, na moral da compaixão schopenhaueriana
deve-se levar em consideração o sofrimento do outro, há aqui a questão da
“identificação interpessoal humana”, do identificar-se com o outro e por meio
da vontade superar o individualismo (HUPPES, 2012, p.49 e 50), contudo, para
Nietzsche, os homens sempre agem movidos pelos seus próprios interesses, não
existindo assim a questão da identificação com o outro mediando as relações,
mas o que existe são as inclinações egoístas e interesses particulares
disfarçados, (HUPPES, 2012, p. 51), pois para Nietzsche “aquilo de que sofremos
de modo mais profundo e pessoal é incompreensível e inacessível para quase
todos os demais”, pois o compassivo nada sabe de toda a sequência de
complicações interiores que a infelicidade significa para mim e para você”, ou
seja, o que envolve a infelicidade, “a irrupção de novas fontes e necessidades,
o fechamento de velhas feridas, o afastamento de passados inteiros” tudo isso
não preocupa o compassivo, pois ele só quer ajudar, não sendo capaz de pensar
que existe uma necessidade interna pessoal interior, que há tremores, terrores
existenciais, “privações e meias-noites”, “riscos e erros tão necessários” em
nossa existência como o seu oposto. (NIETZSCHE, 2001, p. 226 e 226, aforismo
338). Assim, em Nietzsche a noção de compaixão precisa passar necessariamente por
outra questão, a saber, a amizade; pois só entre amigos é possível a compreensão
por inteiro da dor e miséria humana. E só eles, os amigos, podem ter conosco
uma esperança em comum.
RECEPÇÕES
Neste ponto, entra a questão da recepção entre Nietzsche e seus
leitores. Questão, aliás, que é recorrente em suas obras. Se constituindo algumas
vezes como uma verdadeira preocupação do filósofo/filólogo durante sua
trajetória. Como os meus escritos e pensamentos estão sendo recepcionados pelos
meus leitores? Esta é uma preocupação que aparece de modo claro nas obras de
Nietzsche e assim como a maioria dos conceitos pensados pelo autor vai ao longo
dos seus textos e obras variando semanticamente em um constante movimento
existencial, Eduardo Nasser vai sustentar em seu artigo que é entre a “reunião”
de um “leitor que preserva a literalidade do texto” e um “leitor a empreender
uma arte de interpretação” é que “fecunda a figura do leitor ideal em Nietzsche”. E
ler Nietzsche, neste sentido, se torna interessante por que ao conceituar ele
retira as palavras do seu campo semântico habitual e isto provoca/suscita
múltiplas reações em seus leitores. E reações das mais diversas/variadas
possíveis. Reações, muitas das vezes, provocadas
premeditadamente/estilisticamente pelo autor, contudo nem sempre na escrita
nietzschiana os conceitos são recolocados ou construídos às vezes até como personagens
fictícios, apenas estilisticamente (NIETZSCHE, 2005, p. 8 e 9, aforismo 2);
não, pois em Nietzsche a linguagem parece não ter sido inventada para o que
realmente importa, (NIETZSCHE, 2008, p. 78, aforismo 26), por que parece que
tudo que pensamos realmente se importar é desmoronado após o encontro com a
escrita nietzschiana. E com o conceito de compaixão, assim como muitos outros
conceitos reconstruídos pelo autor é mais ou menos isto que acontece, são
desvalorados/transvalorados. Assim, a palavra/conceito
quando mencionada suscita no ouvinte um tipo de recepção, que pode dialogar ou
não com o ponto do qual onde ela partiu, e isto porque a questão da recepção
passa por questões complexas referente à aprendizagem, inteligência, a
cognição, os processos psicossomáticos que interferem na construção dos
pensamentos, além da intersubjetividade
linguística, pois são os falantes “que acertam entre si os aspectos da
situação” comunicados no mundo.
Utilize o link abaixo para comprar as obras do filósofo e contribua para o crescimento deste canal :)
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Inês Lacerda. Do signo ao discurso: introdução à Filosofia da Linguagem.
São Paulo: Parábola Editorial, 2004.
__________. Inês
Lacerda. Subjetividade e linguagem são mutuamente excludentes? Princípios, Natal, v. 14, n. 21,
jan./jun. 2007, p. 83-103.
AUGRAS, Monique. Criatividade e Heurística. Arquivos brasileiros de psicologia aplicada,
Rio de Janeiro, ano 4, v. 24, n. 4, p. 15-29, 1972.
LUBART, Todd. Psicologia
da criatividade. Porto Alegre, RS. Artmed, 2007.
NASSER,
Eduardo. Nietzsche e a busca pelo leitor ideal. Cadernos Nietzsche, São Paulo, v. I n. 35, p. 33-56, 2014.
NIETZSCHE, Friedrich
Wilhelm. A Gaia Ciência. Tradução,
notas e posfácio: Paulo César de Souza. São Paulo, Companhia das Letras, 2001.
___________.
Friedrich Wilhelm. Crepúsculo dos ídolos.
Tradução, notas e posfácio: Paulo César de Souza. São Paulo, Companhia da
Letras, 2008.
___________.
Friedrich Wilhelm. Genealogia da Moral:
Uma polêmica. Tradução, notas e posfácio: Paulo César de Souza. São Paulo, Companhia da Letras, 1998.
___________.
Friedrich Wilhelm. Humano, demasiado
humano. Tradução, notas e posfácio: Paulo César Souza. São Paulo, Companhia
das letras, 2005.